quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Incidência de Multa 475-J CPC - Termo Inicial.

A reforma processual nas execuções para pagamento em dinheiro iniciada em 2005 estabeleceu o processo judicial cível sincrético para assegurar maior celeridade à prestação jurisdicional, bem como mecanismos próprios para o cumprimento da decisão judicial proferida. Uma delas é a multa de 10% estatuída no art. 475-J do Livro de Ritos Cíveis. Sobre esse dispositivo traçaremos os comentários acerca do seu termo inicial em face da omissão legislativa.
Como dito, as mudanças legislativas vieram no afã de facilitar o cumprimento das decisões judiciais, impondo ainda a tão almejada celeridade. Neste toar, surge o entendimento inaugural de que, uma vez configurada na sentença ou no acórdão o quantum, o lapso temporal deveria fluir a partir da intimação de devedor. Entretanto essa corrente não vingou, porquanto, sob o manto da agilidade, não se poderia ofender a segurança jurídica, despindoo processo judicial de regras estabelecidas pela Lex Maxima.
Assim, quatro correntes constitucionalmente pertinentes se formaram a respeito do termo inicial para fluência do prazo de 15 dias para a aplicação da multa de 10%, a saber: 1) o prazo flui após o trânsito em julgado, independentemente de intimação (entendimento do Superior Tribunal de Justiça - STJ); 2) fluência do prazo a partir da intimação do trânsito em julgado na pessoa do advogado do devedor; 3) fluência do prazo a partir da intimação do trânsito em julgado diretamente na do devedor; e, 4) fluência do prazo a partir da intimação do trânsito em julgado na pessoa do advogado do devedor, mas dependente da prévia quantificação do valor devido (cálculo aritmético).
A corrente adotada pelo STJ baseia-se na primeira tese, segundo a qual não há dependência de intimação do devedor para adverti-lo da multa de 10% estatuída no art. 475-J, CPC. Segundo o seu entendimento, que teve o Ministro Humberto Gomes de Barros como pioneiro (REsp 954.859/RS), “não há necessidade de ser o devedor intimado para, então, se iniciar a contagem dos 15 (quinze) dias para o pagamento, tendo em vista que o prazo flui do trânsito em julgado da sentença na qual o devedor já foi intimado, quando de sua publicação, na pessoa de seu advogado. Isso é o que determina o art. 475-J do CPC, para caso em que se trata de quantia certa, que não requer liquidação de sentença, perícia ou outro trabalho técnico de elevada complexidade” .
Muito embora este seja o posicionamento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça, data venia hei de aderir à segunda corrente. Por ela, necessariamente, há de ser intimado o advogado do devedor para tomar ciência do termo inicial do prazo de incidência da multa do art. 475-J, do CPC. A razão é muito simples e adequada à sistemática principiológica fundamental constante na Carta Política de 1988, e o eminente professor e jurista Cássio Scarpinella Bueno, adepto dessa corrente, se expressa muito bem ao expor que “o prazo de quinze dias tende a fluir desde o instante em que a decisão jurisdicional a ser ‘cumprida’ reúna eficácia suficiente (...)” (sublinhe-se).
Nada mais justo e simples! A ordem de cumprimento proferida pelo Juízo, estabelecendo o marco inicial da incidência da multa (segunda corrente exposta acima) corrobora para a executividade incisiva e direta da decisão a ser acatada pelo devedor. Por isso, é de extrema singularidade que o Juízo fique responsável pelo disparo do marco inicial, quando então observe o momento adequado para intimar o devedor, configurado, in casu, com a reunião das condições suficientes para eficácia plena do cumprimento do ato pelo devedor.
Quanto à intimação na pessoa do advogado, registre-se que se trata de um munus atrelado às funções do operador do direito, com enfoque, inclusive, na órbita da Constituição Federal. Além do mais, a lei não impõe a intimação pessoal do devedor, de modo que não subsiste nenhuma ilegalidade/inconstitucionalidade na prática da intimação na pessoa do advogado.
Portanto, fica aqui a crítica à jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, restando clarividente que a postura adotada de não intimar o devedor – na pessoa do seu advogado – pode causar danos irremediáveis, porquanto impedirá que o Juízo analise o momento adequado para fazer valer o pagamento do valor devido. Além do que, como ficou evidenciado, é muito mais prático que o Juiz de Direito do 1º grau estabeleça o termo inicial através da intimação logo após passado em julgado a sentença/acórdão, gerando assim uma maior segurança na realização do ato processual. Este, afinal, é o espírito do princípio constitucional do devido processual legal (e justo).

BIBLIOGRAFIA:
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DIDIER JR. Fredier; CUNHA, Leonardo José Carneiro da; BARGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de Direito Processual Civil. Execução. Salvador: Ed. Podivm, 2010, v. 5.
DONIZETTI, Elpídio. Curso Didático de Direito Processual Civil. 11ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009.
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CALMON, Petrônio. Sentença e títulos executivos judiciais. In: A nova execução dos títulos judiciais: comentários à lei n. 11.232/05. Sérgio Rabello Tamm Renault, Pierpaolo Cruz Bottini (coords.). São Paulo: Saraiva, 2006. Material da 2ª aula da disciplina Cumprimento das Decisões e Processo de Execução, ministrada no curso de especialização televirtual em Direito Processual Civil – UNIDERP/REDE LFG.
LUCON, Paulo Henrique dos Santos. Nova execução de título judiciais e sua impugnação. Material da 10ª aula da disciplina Cumprimento das Decisões e Processo de Execução, ministrada no curso de especialização televirtual em Direito Processual Civil – UNIDERP/IBDP/REDE LFG.
LUCON, Paulo Henrique dos Santos. Títulos Executivos e Multa de 10%. In: Execução civil – Estudos em homenagem ao Professor Humberto Theodoro Junior. Coordenação: Ernane Fidélis dos Santos... (et al). São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007. Material da 3ª aula da disciplina Cumprimento das Decisões e Processo de Execução, ministrada no curso de especialização televirtual em Direito Processual Civil – UNIDERP/IBDP/REDE LFG.
DIDIER JÚNIOR, Fredie. Tópicos sobre a última reforma processual (execução por quantia certa) – Parte 2. In: Revista dos Tribunais, junho/2007. Material da 9ª aula da disciplina Cumprimento das Decisões e Processo de Execução, ministrada no curso de especialização televirtual em Direito Processual Civil – UNIDERP/REDE LFG.

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